quarta-feira, 10 de outubro de 2007

Causos-A Estrada da Muribeca.

O Sr. Sergio Paulo de Mello Feitosa nos manda uma história sobre um dos caminhos mais assombrados de Pernambuco...
A Mata Sul de Pernambuco é uma das grandes rotas de comércio do Estado. Caminho natural para as mais belas praias do Nordeste, também é um grande escoadouro de cargas para as regiões Norte e Sudeste. E quem visita a região percebe grandes extensões da cultura da cana-de-açúcar. É uma paisagem verde e profundamente monótona, apenas movimentada pelo vai-e-vem constante do tráfego e dos camponeses percorrendo o acostamento da rodovia em seus afazeres diários.
Nesse contexto está inserida a chamada "Estrada de Muribeca". Mesmo sendo uma das rotas inevitáveis para uma das grandes ocupações urbanas que compõem um município vizinho do Recife, é um caminho estranho, evitado durante o dia e principalmente durante as altas horas da noite. Pelo fato de ser caracteristicamente soturna, a estrada tornou-se palco de inúmeros crimes que a crônica policial costuma chamar de insolúveis.
Entre tantos que passavam por ali com cautela, estava Francisco - ou "Chico" para os amigos. Motorista experiente, com anos de profissão e conhecedor das regras básicas que todo profissional do ramo sabe de cor , sabia que apenas em extrema situação de necessidade deveria realizar alguma parada naquela estrada: pela profusão de histórias macabras ocorridas no local, os resultados poderiam ser bem desagradáveis.
Mas, em meados dos anos 80 , Chico viu-se atrasado pela equipe que fazia o descarregamento. E ainda foi surpreendido à noite por um inexplicável problema elétrico no caminhão. Teve que voltar com o veículo ao ponto de partida. Ele estava sozinho na boléia e o som do rádio não apagava sua preocupação de estar começando a percorrer aquele caminho tão detestado. Temia que o problema elétrico no caminhão ocorresse novamente.
Era quase uma da manhã quando começou a percorrer o ermo caminho: naturalmente, não havia ninguém na estrada. Nenhum veículo. Nada. O caminhão furava a escuridão com sua luz alta. O desejo de acelerar e sair logo daquela rota era impressionante, mas havia um tacógrafo que o prendia à uma velocidade máxima de 80 quilômetros por hora.
A certa altura da estrada, há uma ponte - ponte essa que tem importância crucial para nossa história. Serve para transpor um pequeno rio. Segundo algumas testemunhas, há muitos anos foi encontrado exatamente ali o corpo de uma mulher _jovem: crime nunca esclarecido. Desde então, testemunhas confiáveis teriam visto lá alguém com as características da mulher morta. Nosso amigo tinha essa e outras preocupações por estar sozinho naquela situação, mas estrada de Muribeca era sua única saída.
Quando faltavam poucos metros para ultrapassar a ponte, Chico não acreditou no que viu: divisou, parada na balaustrada direita e fazendo sinal com uma das mãos, uma mulher da qual ele se lembra bem até hoje. Usava roupas brancas e simples. Blusa e saia. Tinha cabelos soltos, um pouco longos e pele morena. Auxílio a ela não daria! Não pensou duas vezes e nem por um momento reduziu a velocidade do caminhão. Viu aquela imagem se distanciando pelo retrovisor do carro. Não se sentiu muito aliviado por não ter parado. Pensou que poderia ter ajudado alguém em situação difícil. Mas, definitivamente, não parou.
Não teve muito tempo para elaborar justificativas. Pelo canto do olho percebeu ao seu lado a materialização de um vulto branco - exatamente no banco do passageiro. O rádio agora falava para o "nada". Bastaram segundos para que ele sentisse uma onda de calor e um suor frio por todo o corpo. Um impulso o fez olhar para o lado. Ali estava ela, agora bem visível. Um rosto quase severo... e uma pergunta telepática para o motorista: "por que você não parou?".
O medo em seguida teve efeito paralisante. Naquele momento, ele desmaiou sobre a direção e o caminhão adentrou pelos canaviais, batendo num aclive do terreno e capotando uma vez. Chico foi encontrado ainda inconsciente nas primeiras horas da manhã e transportado para o Recife.
Depois disso, passou meses sem conseguir tocar num volante. Tinha crises de choro constantes. Retornou às suas atividades lentamente e hoje duas regras foram acrescentadas às outras que sabe de cor: 1) motorista de caminhão, nunca mais; 2) jamais percorrer a qualquer hora do dia ou da noite a Estrada da Muribeca.

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